TU VAIS LEMBRAR...




Quando os cabelos da cor da neve dominarem a tua face...
Quando os dias se fizerem frios, porque a gélida solidão será presença constante ao teu lado...
Quando os dias se fizerem de insistente saudade…
Tu vais lembrar...
Vais lembrar das tardes quentes, quando levavas a passear os pequenos e havia risos de alegria, lambuzeira de rebuçados e pipocas espalhadas pelo carro.
Recordarás as brincadeiras deles, usando a mangueira do jardim para se molharem uns aos outros, em vez de regar as árvores.
Lembrarás a tua voz recomendando menos confusão, economia de água, de energia eléctrica...
Lembrarás as mãos pequenas que mexiam na tua orelha, enquanto os olhos se tentavam fechar, entregando-se ao sono.
Lembrarás do urso de peluche, de olhos grandes, deixado no banco de trás do carro, acompanhando-te em viagens de trabalho, em visitas a clientes. O pequeno urso que ficava ali, sempre à disposição, aguardando o regresso do seu dono, no fim do dia.
Lembrarás as vozes perguntando: Pai, pegas-me ao colo? Não estou a ver nada daqui. Sou muito pequeno.
Levas-me ao colo? Estou cansado.
Mãe, gostas de mim?
Lembrarás dos lanches nas tardes de fim-de-semana, das visitas inesperadas; das festas nos aniversários; das cartas que chegavam; das viagens com os amigos; dos amores, dos carinhos, das lágrimas de emoção e contentamento.
Tu vais lembrar...
Tudo passará pelo caleidoscópio das memórias, trazendo-te ao coração ternura e saudade.

Pensa nisso nos dias que vives e aproveita ao máximo o afecto que tens de momento, da presença, da alegria.
Mantém a aparência juvenil, embora o tempo teime em te colocar fios de prata nos cabelos bastos e arabescos da face.
Conserva o sorriso espontâneo e claro, mesmo que a alma esteja em trajes de luto.
Memoriza os momentos felizes e arquiva tudo no canto mais privilegiado da tua mente.
Não esqueças nenhum detalhe: o dia cheio de luz ou a chuva insistente; as roupas coloridas, o boné levado pelo vento; os risos, o dói-dói, o aconchego dos pequenos no teu colo; o adormecer cansado nos teus braços, após horas de corrida e cambalhotas pelo parque; o cheiro de bebé, o perfume do champô, os cabelos escovados ou despenteados, rebeldes, caídos pelos ombros.
Observa tudo. Grava tudo. Um dia, quando a solidão se sentar ao teu lado, esses detalhes, essas pequenas grandes coisas irão fazer-te companhia.
Tu irás retirá-las, uma a uma, do baú de memórias e alimentarás as tuas horas, para continuar a ser feliz, como és hoje.
E talvez nem te dês conta do quanto és feliz.
Preparando a felicidade do teu amanhã, tu acabarás por descobrir, ainda hoje, o quanto és feliz.