COMO É QUE SE ESCREVE...?



Quando o Pedro tinha apenas cinco anos, a educadora do Jardim de Infância pediu aos miúdos da sua sala que fizessem um desenho de algo que eles gostassem bastante. O Pedro desenhou então a sua família. Depois, fez um grande círculo com um lápis vermelho à volta de todas as figuras. Desejava escrever uma palavra por cima do círculo, e por isso ele saiu da mesa onde se encontrava e dirigiu-se à educadora que todos tratavam por professora.
- Professora, como é que se escreve...?
Mas ela não o deixou acabar a pergunta. Mandou-o sentar-se de novo no lugar e que não voltasse a interromper e a distrair os outros. Pedro, resignado, dobrou o papel e guardou-o no bolso.
Quando regressou a casa, naquele dia ao fim da tarde, ele lembrou-se do desenho e tirou-o do bolso. Alisou-o bem sobre a mesa da cozinha, foi até à sua mochila, pegou num lápis e olhou para o grande círculo vermelho. A mãe estava a fazer o jantar, andando entre o fogão, o lava-louça e a mesa. Mas ele queria terminar o desenho antes de o mostrar.
- Mãe, como é que se escreve...?
- Pedro, não vês que estou ocupada agora? Vai brincar lá fora. Vai…e não faças barulho! - foi a resposta dela.
Ele dobrou outra vez o desenho e voltou a guardá-lo no mesmo bolso.
Ainda naquela noite, após o jantar, ele voltou a tirar outra vez o desenho do bolso. Olhou para o grande círculo vermelho, foi até à cozinha buscar o lápis que lá tinha deixado. Ele queria mesmo acabar o desenho antes de mostrá-lo ao pai. Alisou, mais uma vez, e bem, as dobras, e pôs o desenho no chão da sala, perto do sofá onde se encontrava recostado o pai.
- Pai, como é que se escreve...?
- Pedro, agora não. Estou a ler o jornal que ainda hoje não tive a oportunidade de ler. Faz-me um favor e não me interrompas. Vai brincar para o teu quarto. E não faças barulho, está bem?
O pequeno Pedro mais uma vez voltou a dobrar o desenho e a guardá-lo no bolso.
No dia seguinte, quando a mãe separava a roupa para lavar, encontrou naquele bolso das calças do filho um papel enrolado, mais uma pequena pedra, um elástico e dois rebuçados já muito amassados. Todos os tesouros que ele descobria enquanto brincava, quer na rua, quer no seu quarto. Ela nem desdobrou o papel. Rapidamente meteu tudo, de uma só vez, no balde do lixo.

Os anos passaram...
Quando o Pedro tinha 28 anos, a sua filha de cinco, Ana, fez um desenho. Era o desenho da sua família. O pai riu-se quando ela apontou uma figura alta, de forma indefinida e disse:
- Este, aqui, és tu!
Ana também riu. O pai olhou para o grande círculo vermelho feito pela sua filha, à volta das figuras desenhadas e lentamente começou a passar o dedo sobre o círculo. Ana desceu rapidamente do colo do pai e quase gritou antes de desatar numa correria pela casa:
- Eu venho já!
E voltou. Com um lápis na mão. Acomodou-se outra vez nos joelhos do pai, posicionou a ponta do lápis perto do topo do grande círculo vermelho e perguntou:
- Pai, como é que se escreve amor?
Ele abraçou a filha, agarrou na sua pequena mão e foi conduzindo-a, devagar, ajudando-a a formar as letras, enquanto dizia:
- Amor…minha filha…amor escreve-se com as letras T…E…M…P…O…