QUERO SER TEU AMIGO PARA SEMPRE




Tinha acabado de fazer mais uma intervenção em directo para a rádio. Despedi-me dos meus entrevistados. Do Jorge e dos restantes elementos do grupo de representação teatral “Os Fidalgos”, que iriam actuar mais à noite. E, no momento em que ainda estava a arrumar o meu material, oiço chamar pelo meu nome, olho para trás, e vejo três meninos. Um, mais afoito, pergunta-me, embora com algum embaraço: és o João Pedro Martins?
Eram três meninos, todos com 17 anos, mas podiam ter bem menos, porque assim parecia, daí a minha surpresa pelo interesse neles em me querer conhecer pessoalmente. Trocámos algumas palavras. Eles, mais na qualidade de ouvintes, enquanto eu ia falando como, aliás, é meu apanágio, sem parar.
Foi ao final da tarde. Estavam os três vestidos a rigor com o uniforme do liceu nacional. Pela troca de palavras tímidas que me iam dirigindo fiquei a saber que um quer ser advogado. Disse-lhe, claro, o que qualquer pai diria a um filho: estuda, continua a estudar, não desistas nunca. A vida é dura, está dura em todos os lados, para toda a gente, mas mantém essa vontade firme e luta por ela. Não desistas nunca de aprender.
Os outros ouviam-me em silêncio.
À despedida, curiosamente, aquele que se manteve mais calado, o mais reservado dos três meninos, esticou a mão para me cumprimentar, apertou-a, e deixou sair algo que nunca mais vou esquecer enquanto viver: “Quero ser teu amigo para sempre”.
Este menino, tal como os outros dois, tem 17 anos, frequenta a 11ª classe do liceu nacional da Guiné-Bissau, chama-se Ivkovic, porque o pai quis homenagear o guarda-redes outrora do Sporting – sorri-lhe, para conseguir segurar uma lágrima de orgulho por aquilo que o fiz sentir sempre que falo “no” rádio… e nunca mais o esquecerei.
“Quero ser teu amigo para sempre” – foi a frase mais bonita que eu jamais imaginava escutar da boca de um menino de 17 anos que me escuta e me conhecia apenas pela voz.
É sobretudo destes momentos, destes meninos, das suas palavras, dos seus sorrisos, que eu vou reter nas minhas memórias para sempre.
Como poder continuar a deixar passar a mensagem de que a Guiné-Bissau é apenas aquilo que as pessoas ouvem nas notícias que passam, sem sequer a conhecerem de perto?
Tenho uma missão que trouxe comigo de regresso a Lisboa. O mundo que me escuta tem que acreditar nestes meninos de 17 anos, que vestem o uniforme bonito do liceu nacional, andam na 11ª classe e têm sonhos… e têm o direito de acreditar que podem um dia transformar em realidade os sonhos que têm hoje.
O resto do mundo só tem que os ajudar a acreditar. E, para isso, bastam palavras de incentivo, palavras de confiança, palavras de esperança. Nunca desacreditá-los. Afinal de contas, se os meninos sonham, o mundo pula e avança.
E os “Ivkovic’s” da Guiné-Bissau vão ser importantes para o seu país como o antigo guarda-redes foi para a sua selecção nacional. As bolas não entram se neles existir confiança.
Capacidades, estes meninos têm, como todos os outros meninos das terras mais ricas…



Esta música é da autoria de TCHANDO, um extraordinário músico guineense que vive na Dinamarca e faz parte de um grupo chamado BLISS.